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Com a alteração na LDB, o ingresso na escola torna-se obrigatório a partir dos 4 anos. Mesmo assim, alguns pais defendem o ensino em casa
Em
abril, a sanção da lei que determina mudanças na Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional (LDB) tornou a educação básica obrigatória a
partir dos 4 anos, fazendo com que os pais tenham de matricular os
filhos na escola mais cedo. A medida contrasta e chama a atenção para
uma alternativa de ensino que toma forma no Brasil: a domiciliar.
A professora da Faculdade de Educação da Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Libânia Xavier indica que, para a
educação, de modo geral, a obrigatoriedade traz benefícios. "Se houver
boa infraestrutura e qualidade de ensino, teremos crianças socializando e
iniciando o aprendizado com supervisão mais cedo. Isso é um ganho
enorme", defende. Doutor em educação e professor da Faculdade de
Educação da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
(PUC-Minas), Carlos Roberto Jamil Cury acredita que a mudança na LDB
pode estimular o debate sobre a educação no Brasil, uma vez que a
questão da obrigatoriedade é bastante complexa, por ser onde conflui o
direito da criança do adolescente e o dever do Estado.
Diretor jurídico da Associação Nacional de Educação
Domiciliar, Alexandre Magno Fernandes Moreira aponta que a modificação
não deve afetar as famílias que escolhem educar os filhos em casa, uma
vez que a alteração apenas reduz a idade da matrícula, que já era
obrigatória aos seis anos. "É importante lembrar que a LDB trata da
educação escolar, não menciona o ensino domiciliar", ressalta o
advogado. De acordo com a associação, entre 800 e mil famílias optam por
esta prática no Brasil. Nos Estados Unidos, onde o "homeschooling" é
mais difundido, 1,5 milhão de estudantes têm aulas em casa, segundo
dados do National Center for Education Statistic.
Moreira indica que, muitas vezes, os pais têm receio de
sofrer consequências judiciais ao não matricularem os filhos. Na LDB, a
educação consta como dever da família e do Estado, o que dá margem a
diferentes interpretações a respeito do ensino em casa, que não é
expressamente mencionado. O advogado afirma que, juridicamente, o grande
desafio é explicar o processo educacional às autoridades e que é
importante que os pais demonstrem que a aprendizagem está acontecendo,
caso o conselho tutelar ou o Ministério Público sejam acionados.
Para acabar com a insegurança jurídica e regulamentar a
educação domiciliar, o deputado Lincoln Portela (PR-MG) propôs o projeto
de lei 3179/2012, que, em novembro de 2012, recebeu parecer favorável
do então relator da Comissão de Educação e Cultura, Maurício
Quintenella. O deputado, contudo, deixou a comissão, que aguarda novo
relator. A proposta tramita em caráter conclusivo e também deve ser
analisada pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania.
Deputado foi alfabetizado pelos pais
Portela afirma que não há previsão de aprovação da medida e que há resistência de alguns setores. "O Brasil tem neofobia. Precisamos sair do subdesenvolvimento", aponta, afirmando que a ingerência do Estado sobre a família é muito maior nos países pobres. O deputado conta que o PL surgiu a partir de sua própria experiência, pois apesar de ter ido à escola, foi alfabetizado pelos pais. "Aprender em casa faz com que as crianças vejam ensino com naturalidade, e isso gera autodidatismo", defende.
Portela afirma que não há previsão de aprovação da medida e que há resistência de alguns setores. "O Brasil tem neofobia. Precisamos sair do subdesenvolvimento", aponta, afirmando que a ingerência do Estado sobre a família é muito maior nos países pobres. O deputado conta que o PL surgiu a partir de sua própria experiência, pois apesar de ter ido à escola, foi alfabetizado pelos pais. "Aprender em casa faz com que as crianças vejam ensino com naturalidade, e isso gera autodidatismo", defende.
O pedagogo e pesquisador de educação domiciliar Fabio
Schebella aponta ainda outros motivos para a opção do ensino doméstico.
Segundo ele, a questão geográfica é determinante para famílias que moram
longe da escola ou que se mudam com frequência, e a personalização do
ensino de acordo com as necessidades do aluno também deve ser destacada.
"Muitos pais não concordam com a forma como os conteúdos são tratados
na escola e querem adaptá-los a suas visões políticas ou científicas",
acrescenta.
Este foi o motivo que levou Luiz Carlos Faria da Silva a
optar pelo método. Doutor em educação e professor do Departamento de
Fundamentos de Educação da Universidade Estadual de Maringá, ele queria
poder decidir o currículo escolar e o professor dos filhos Lucas, 15
anos, e Júlia, 13 anos. Inicialmente, a ideia era que ambos estudassem
em casa até os 7 anos e depois fossem à escola convencional.
O rapaz frequentou o colégio privado por pouco mais de
dois anos, e a menina por cerca de um ano. Quando as crianças faltaram
às aulas, o conselho tutelar foi comunicado, o que iniciou um longo
processo de negociação com o grupo e com o Ministério Público, durante o
qual Silva e a mulher, que é pedagoga, fizeram uma segunda tentativa de
institucionalizar a educação dos filhos, colocando-os em uma escola
pública, onde ficaram por apenas 15 dias. "A escola fazia mal para eles
do ponto de vista social e moral", declara o pai.
Finalmente, a família e o Estado chegaram a um acordo
quando as crianças passaram a realizar avaliações periódicas aplicadas
por uma equipe pedagógica designada pelo Núcleo Regional de Educação de
Maringá. A certificação de escolaridade, por outro lado, pode ser
adquirida por meio do Exame Nacional para Certificação de Competências
de Jovens e Adultos, para o ensino fundamental, e do Exame Nacional do
Ensino Médio. "Hoje praticamente não há necessidade de ir à escola. A
criança aprende qualquer coisa em casa, pois as possibilidades de
aprendizagem são muito amplas", defende Silva.
Convivência
A função da escola como espaço de convivência é um dos principais pontos indicados pelos críticos do ensino domiciliar. Cury descreve a instituição como um dos poucos espaços oficiais de obrigações e deveres restantes. "A escola estimula a convivência pacífica e o respeito pelo outro. No mínimo, se aprende a tolerância. E não é só isso, o conhecimento científico também se favorece com a troca", explica.
A função da escola como espaço de convivência é um dos principais pontos indicados pelos críticos do ensino domiciliar. Cury descreve a instituição como um dos poucos espaços oficiais de obrigações e deveres restantes. "A escola estimula a convivência pacífica e o respeito pelo outro. No mínimo, se aprende a tolerância. E não é só isso, o conhecimento científico também se favorece com a troca", explica.
Libânia complementa que, em um mundo cada vez mais
individualista, a escola acaba se tornando um dos poucos espaços de
socialização e aprendizagem do convívio social para as crianças. "A
instituição não se resume ao ensino do conteúdo. Engloba também um
projeto de sociedade em que o aluno aprende a dividir e se comportar em
grupo", destaca. Diante do argumento da crescente onda de bullying
utilizado por alguns pais para manter os filhos em casa, a docente
rebate que a situação, apesar de negativa, ensina crianças e professores
a lidarem com isso, e de nada adianta esconder o problema.
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